Os brutos também amam |
Ah os franceses... sempre sabem o que fazem!Foi isso que pensei ao sair no final de Uma Primavera com Minha Mãe (Quelques heures de printemps).Fui ver o filme, como quase sempre,sem saber nada sobre ele,fui seguindo a dica do meu amigo Rômulo(valeu Romim!) e saí do cinema arrasada,no bom sentido.Logo nas primeiras cena já deu pra sentir o climão do filme,drama puro,minha gente!Mas não é qualquer drama,é um drama francês,com a crueza e beleza típica do estilo dos comedores de croissant.Se fosse um filme americano,veríamos a linda história da reconciliação de filho e mãe ,regado a muitas lágrimas e trilha sonora marcante,exatamente o que não acontece aqui.De início, conhecemos Alain,caminhoneiro recém saído da prisão e Yvette, sua mãe doente e durona.A relação entre os dois é tensa,cheia de rancor e aspereza,como é mostrado pela atuação certeira dos atores.Na maioria das cenas,acompanhamos a dinâmica do cotidiano dos dois,testemunhando os silêncios,os olhares e as palavras duras, entre eles,numa crescente de irritação ,que culmina numa cena fortíssima de uma briga,numa das melhores cenas do filme. E se vocês querem saber,Vincent Lindon e Hélène Vincent estão muito afinados e fazem qualquer um se tremer com a explosão em cena.Pra adoçar um pouco as cenas e servir de elo entre os dois, temos a linda cachorra Calie e o vizinho,o velhinho fofo, senhor Lalouette,os dois aparecem como pontes ,tentando diminuir o distanciamento entre mãe e filho,que parece irreversível,até que chegue o infalível,o acessório preferido dos roteiros dramáticos:o câncer.
Quando Yvette decide encarar a morte com uma força e uma dignidade comoventes,vemos Alain ,silenciosamente, apoiar a mãe e dar-se conta da inutilidade das desavenças e rancores, diante do poder da morte.A partir desse ponto,começa uma narrativa enxuta e pungente sobre a eutanásia .Yvette decide como vai morrer e sua escolha é mostrada com imparcialidade,deixando pra gente a tarefa de julgar ou não,o direito de cada um sobre a própria vida.A sequência final, que mostra Yvette indo para a Suiça,onde vai realizar a eutanásia,é de uma delicadeza ímpar,Stéphane Brizé mostra a elegância de sua direção e põe na tela a resignação e a angústia de Yvette,em detalhes cruciais que tiveram um efeito super lacrimogênio em mim.Se você está se perguntando se há reconciliação entre essas duas almas atormentadas,fique feliz,há uma breve abertura entre eles,que permite dar vazão ao amor escondido e machucado dos dois e às lágrimas que de quem ainda estava tentando manter a dignidade no cinema.O final do filme me fez lembrar do mestre Antonioni e de sua perfeita trilogia da incomunicabilidade,que da mesma maneira que Uma primavera,mostra o quanto nós podemos nos isolar, no mundo das incompreensões e das coisas não ditas,que sempre nos separam da felicidade do contato com outro ser humano.Uma primavera é um filme para os fortes,para os que entram na sala e não tem medo de sentir,portanto,se você não tá no mood pra choque de realidade e sentimentalismo,não veja o filme,mas se você quiser sofrer um pouco taí o seu remédio.Fica a dica então, só mais um pitaco,quem gostou desse também pode gostar de :